
A forma como se consome música no mundo mudou. Seja qual for a plataforma, o fato é que são pouquíssimas as pessoas que ainda compram CDs e DVDs para ouvir seus artistas favoritos. O ambiente digital e a possibilidade de consumir música via internet traz, porém, um vazio regulatório que o Ministério da Cultura (MinC) pretende preencher com a abertura de consulta pública, em 15 de fevereiro, para uma instrução normativa que pretende regular como se dará a cobrança de direitos autorais e conexos no ambiente digital. O pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da Escola de Direito do Rio de Janeiro (Direito Rio), Pedro Augusto Francisco, analisa.
O controverso tema que envolve a reforma da lei de direitos autorais foi iniciado em 2010. Desde então, é a primeira vez que o MinC apresenta propostas para regular de forma específica o uso de obras protegidas na Internet. Segundo Pedro Augusto, a iniciativa surge em momento oportuno, pois a indústria cultural vive um processo de consolidação da re-intermediação das relações de produção e consumo de música digital.
“Se antes a música era vista como um produto, agora funciona mais como um serviço. Esta é provavelmente a forma que vai dominar o consumo cultural nos próximos anos.
Os criadores vão depender cada vez mais dos serviços digitais, e para isso vamos precisar de regras claras e específicas que regulem a relação das plataformas com os detentores de direitos”, analisa o pesquisador do CTS.
A avaliação de Pedro Augusto é embasada em números da indústria, que mostram a queda das vendas de CDs e DVDs e a ascensão dos serviços de transmissão via internet nos últimos anos. Dados da Associação Brasileira de Produtores de Discos, de 2014, apontam que o mercado fonográfico brasileiro registrou retração de 15% nas vendas de música em suporte físico, repetindo a queda de 2013. Por outro lado, a renda global gerada pelos direitos de execução pública em 2014 atingiu a marca de U$ 1,19 bilhão, o que representa um aumento de 20% quando comparado com 2012, segundo dados da International Federation of the Phonographic Industry. No Brasil, as informações divulgadas pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) mostram que, de 2012 para 2013, houve um aumento de cerca de 90% nos valores arrecadados pela execução pública.
O CTS acompanha as transformações no cenário da indústria musical desde 2012 e, ainda este ano, vai publicar um livro com os resultados dessa pesquisa sobre música, gestão coletiva e o ambiente digital. O estudo aponta para a necessidade de observar essas plataformas como atores importantes do sistema de gestão coletiva, inserindo-as nas regras de arrecadação e distribuição. O texto apresentado pelo MinC endereça esse problema, apontando o ECAD como responsável pela recolhimento e distribuição dos royalties de execução pública de músicas na Internet. A instituição passou por mudanças após a aprovação da Lei 12.853, de 2013, estando agora sujeita à supervisão do Ministério da Cultura.
“É importante que todos os interessados participem, lendo atentamente o texto e refletindo sobre os possíveis impactos em sua atividade. Trata-se de um importante momento para resgatar a mobilização que se articulou na época do debate sobre direitos autorais quando o anteprojeto de reforma da Lei de Direitos Autorais foi discutido. E somente com a presença dos interessados será possível garantir que a norma concilie os interesses de criadores, produtores e consumidores de obras intelectuais”, conclui.