
Desde o resultado das eleições presidenciais, em novembro do ano passado, discute-se a regra de indicação de Ministros para o Supremo Tribunal Federal (STF). Para modificar a atual regra, o Congresso deve avaliar nos próximos meses uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretende dividir a responsabilidade da indicação para a corte entre os Três Poderes.
Pela proposta da PEC 473, caberia ao chefe do executivo indicar quatro representantes; ao Congresso Nacional, outros quatro ministros; e, ao próprio STF, completar o quadro da corte, com as outras três vagas restantes.
Para o especialista em Direito Constitucional e professor da FGV Direito Rio, Thomaz Pereira, essa mudança na escolha dos Ministros é negativa, uma vez que o sistema atual já compartilha o poder de nomeação para o STF entre executivo e o legislativo, já que o Senado tem poder de veto à indicação presidencial.
“O fato do Senado não exercer normalmente este poder não significa que ele não seja efetivo. Afinal, sua mera possibilidade é algo que deve ser considerado pelo presidente antes de indicar o seu escolhido. Inegavelmente, presidentes levam em consideração a possibilidade de rejeição do Senado ao fazer suas escolhas. Se há mudanças a serem feitas nesse processo, elas dizem mais respeito à transparência desse processo de indicação pela presidência e à postura do Senado no momento da sabatina do indicado”, explica o professor.
De acordo com o texto, o presidente manteria a possibilidade de indicar ao STF o nome de sua preferência. Já os escolhidos do legislativo e judiciário seriam pinçados de listas tríplices. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério Público (MP) seriam os responsáveis pela lista enviada aos parlamentares. Já as escolhas da própria Corte seriam embasadas na relação formulada por tribunais superiores, Tribunais Regionais Federais e tribunais de Justiça dos Estados. Essa regra, na visão do especialista, poderia “engessar” a estrutura do tribunal.
“Essas listas deverão levar a que o MP sempre indique promotores, a OAB, advogados e os Tribunais, juízes, mas serão eles os promotores, advogados e juízes com melhor perfil para ministros do STF? Isso não está claro. De fato essas demandas de diversidade de origem já são ouvidas e atendidas no sistema atual. O STF é, sim, composto por juristas que vieram dessas três carreiras – e da academia. Engessar e determinar que certas vagas são de um, e outras, de outro, pode gerar outros problemas - como corporativismo e a contaminação da corte pela política interna de outras instituições”, alerta.
O professor explica ainda que, ao mesmo tempo em que faz essa divisão, a PEC proíbe que o chefe do executivo nomeie alguém que, nos dois anos anteriores, tenha exercido mandato eletivo, ocupado os cargos de Ministro de Estado, Procurador-Geral da República, Defensor Público-Geral da União e Advogado-Geral da União, ou exercido a função de presidente de partido políticos nos dois anos anteriores, mas que essa regra não vale para os indicados pelo legislativo e judiciário.
“Essa é uma medida que parece querer isolar o tribunal da política, mas não está claro o porquê. Afinal, os outros poderes poderiam nomear essas pessoas e o STF tem sido composto por pessoas que tiveram exatamente este perfil no decorrer de sua existência, alguns dos quais são até hoje celebrados como uns dos mais notáveis ministros que já passaram pela corte. Inegavelmente, grandes juristas com grande experiência jurídica - com sua relação com a política - já ocuparam esses cargos. Vetar absolutamente uma pessoa com esse perfil de ser nomeada pode impedir que, exatamente aquele candidato com o melhor perfil o seja”, explica.
A PEC apresentada também modifica os mandatos do ministros. Pela regra atual, os membros da Corte podem permanecer no cargo até os 75 anos, quando é aposentado compulsoriamente. Se a emenda for aprovada, os futuros ministros do STF teriam mandatos de 12 anos. Para Thomaz, esse sistema, que estabelece uma renovação gradual e contínua seria mais adequado.
“A fixação de mandatos seria, de fato, uma mudança positiva. O modelo atual tem dois problemas: a possibilidade de um presidente indicar um ou vários ministros é completamente aleatória, pois depende da aposentaria voluntária ou do aniversário de 75 anos dos ministros, fazendo com que presidentes igualmente eleitos pelo voto popular tenham mais ou menos poder de influenciar a sua composição. Outro problema é que a possibilidade de um ministro ficar mais ou menos tempo no tribunal é aleatória, pois depende da idade em que esse ministro foi nomeado, o que gera uma desigualdade entre ministros. Com o sistema atual, engessa-se a composição as vezes por longos períodos, se renovando às vezes subitamente. Um sistema em que a renovação seja gradual e contínua é certamente mais adequado”, comenta.
Para que essas mudanças entrem em vigor, porém, há um longo caminho. A PEC deverá ser aprovada em dois turnos pelos plenários da Câmara e do Senado, onde haverá a possibilidade de os parlamentares apresentarem modificações ao texto original, o que torna a aprovação ainda mais distante.